Tripé pH x KH x CO2
O tripé pH x KH x CO2 – o começo de tudo
Por Eduardo Fonseca Jr
08/02/2024
A tabela de CO2 pelo cruzamento das medidas de pH e KH é uma velha conhecida de todo aquarista de plantado. É a partir dela que balizamos o sistema desde o começo e é desse ajuste que depende toda a sua saúde. O tripé pH x KH x CO2 é, certamente, o fundamento primordial do aquário plantado, sem o qual não faz nenhum sentido falar de qualquer outra coisa. É o chassi sobre o qual se monta todo o conhecimento teórico e prático que temos desenvolvido nesses vinte e cinco anos do surgimento do aquário plantado. As pessoas sabem ler essa tal tabela, mas será todos sabem usá-la como uma ferramenta de manobra? Tenho tentado ensinar as pessoas sobre esse valor prático da tabela, mas percebo que muita gente ainda tropeça em conceitos equivocados ou incompletos. Sem o conhecimento correto sobre o par pH x KH, não há luz no fim do túnel, nem se copiar para si os números de aquários saudáveis, como uma receita, que é o que muitos ainda fazem. Nesse artigo, eu quero cravar alguns fundamentos teóricos, sem, no entanto, me esforçar demais sobre as definições formais das coisas (presumo que já tenham um conhecimento prévio do Livro 1), para que possamos discorrer sobre a prática um pouco mais adiante.
Partindo mais ou menos do princípio, o pH é a medida da atividade dos ácidos no meio. Quando se diz a atividade de um ácido, nos referimos à atividade dissociativa do(s) hidrogênio(s), seu trânsito, e não a concentração do ácido em si. Esse é o princípio teórico mais básico de todos quando falamos de pH; quando medimos o pH de um ácido, digamos, o H2CO3 (ácido carbônico), não medimos a concentração do ácido como um total, mas somente os hidrogênios que transitam na molécula, ora associando (e não são medidos pelo teste), ora dissociando (quando são vistos pelo teste). Logo, o pH só mede, de fato, a concentração dos hidrogênios livres, aqueles que os ácidos dissociaram. Cada ácido tem, vamos dizer assim, um humor, um temperamento, de dissociar ou de reter os hidrogênios, como uma escala de graduação de força. Os ácidos que dissociam mais facilmente os hidrogênios possuem uma atividade mais intensa de hidrogênios se desprendendo das moléculas, sendo, portanto, ácidos mais agressivos ou, formalmente falando, ácidos fortes. Na via contrária, ácidos que retêm com mais força os hidrogênios e custam a dissociá-los, não tem tanto (embora tenha algum) trânsito de hidrogênios nas moléculas, sendo, pois, chamados de ácidos fracos. Esse é o segundo equívoco mais comum do aquarista leigo em química que começa a estudar um pouco as coisas; a força ou a fraqueza dos ácidos não se refere à sua capacidade de segurar os hidrogênios, mas sim ao trânsito deles. O trânsito de hidrogênios confere agressividade corrosiva à solução, pois eles podem se ligar e destruir outras moléculas.
Ok, guarde na cabeça o que falamos do pH. Agora vamos falar de KH.
O KH nada mais é que a medida de ácidos fracos na solução, a medida de ácidos ansiosos por encontrar e reter hidrogênios livres, como Tios Patinhas recolhendo moedas sem quase nunca gastá-las. Por gastarem pouco, esses Tios Patinhas são chamados de “consumidores fracos” de forma análoga aos ácidos fracos que “gastam” poucos hidrogênios, mantendo-os em seus bolsos. Ficou simples de entender, certo? Agora vamos chamar esses Tios Patinhas de buffers, ou seja, um buffer (“amortecedor” em inglês) é um ácido fraco, um ácido que retém com mais força os hidrogênios na molécula.
Figura 1 – O buffer Tio Patinhas que guarda mais os hidrogênios do que os gasta.
E eis aqui uma enorme confusão que se gerou no mercado: por que uma tal marca recomenda que se use o “buffer ácido” com o “buffer alcalino” para se corrigir o KH? Bom, agora vocês estão prontos para responder essa pergunta: existe buffer ácido ou alcalino? Não! Só existe buffer. Não existe um “ácido fraco alcalino” e um “ácido fraco ácido”, não faz o menor sentido. Os nomes dos produtos são apenas nomes de produtos, não correspondem tecnicamente ao que são de verdade. Não deixem que esses nomes criem confusão nas definições técnicas reais das coisas. Logo, o buffer alcalino é o buffer real e o tal do buffer ácido é, na verdade, só um ácido mais forte. O que acontece quando juntamos as duas coisas? Se você disse “um anula o outro” você está correto. Os hidrogênios “soltos” do tal buffer ácido serão recolhidos pelo tal buffer alcalino e no final teríamos duas moléculas em repouso, satisfeitas com a troca entre si, já praticamente sem interação. Quem esperaria que essas moléculas em repouso ainda pudessem fazer alguma coisa com os ácidos naturais do aquário? Não podem fazer nada, nem continuar servindo como buffers porque seus bolsos já estão praticamente cheios de hidrogênios sem espaço para guardar mais. Logo, se o aquário produzir mais ácido, os hidrogênios desse ácido, ao invés de serem retidos pelos buffers avarentos, ficarão sobrando, ativos, em outras palavras, baixando o pH. Imaginando essa dinâmica, fica mais fácil entender como o buffer assegura a estabilidade do pH recolhendo hidrogênios. Se conseguiu entender tudo até aqui, então está indo muito bem. Continue porque ainda não acabou.
Vamos expandir o conhecimento prático. O que acontece quando um aquarista sobe o KH? O pH sobe junto porque, quando os Tios Patinhas chegam, eles chegam enfiando hidrogênios em seus bolsos. Isso diminui o trânsito de hidrogênios livres na solução e o teste de pH enxerga menos deles por aí. É nesse ponto que muita gente comete mais um grande engano, sobretudo os iniciantes: como subir o KH sem subir o pH? Sem a interferência de outro agente, é impossível, meu amigo. Certa vez, um camarada me perguntou se eu podia sugerir algum buffer que não subisse o pH. Essa é a maior prova de que ele não tem a menor ideia do que está fazendo com seu aquário. Quando eu disse que tal coisa não existia, ele respondeu “ok, obrigado” como se eu estivesse fazendo lobby para o mercado. Imagino que ele deve estar procurando por tal buffer até hoje…
Mas enfim, como ter um KH em 7, por exemplo (isso é só um número hipotético, não uma receita), sem ter um pH de 7,6? Você precisa injetar ácido de forma constante a fim de “esticar” o pH para baixo enquanto o KH se mantém lá em cima. Mas alguém poderia perguntar “com essa injeção constante de ácido, o buffer não encheria totalmente seus bolsos de hidrogênio até serem completamente anulados (e o KH estaria em zero)? Sim, meu amigo, teoricamente você tem razão, mas acontece que no aquário as coisas são um pouco diferentes devido a natureza do buffer, o CO2. Quando o CO2 reage com a água, o resultado é uma molécula de H2CO3. O buffer no caso, é o CO32-, com dois bolsos (2- sobrescrito) para dois hidrogênios, agora cheios na forma de ácido carbônico (H2 + CO3). Acontece que manter a molécula nesse estado, com dois hidrogênios no bolso, é muito difícil no pH do aquário, sendo que os buffers precisam “pagar” um dos hidrogênios como uma despesa (isso também está detalhado no Livro 1), logo, se tornando HCO3– (bicarbonato). Nesse contexto, podemos pensar que todo o CO2 injetado na água estaria pagando esse hidrogênio e construindo uma grande reserva alcalina (KH) na forma de HCO3– com o KH tendendo ao infinito, certo? Calma, pense melhor: para onde iriam tantos hidrogênios se descolando dos H2CO3 e se acumulando numa tendência infinita? Como sabemos que é impossível o KH subir infinitamente com o pH caindo infinitamente, podemos supor que as duas coisas ficariam no meio do caminho, se anulando, com um KH mais alto e um pH mais baixo, num equilíbrio artificial… está correto, mas se lembre que a entrada do CO2 é constante, gerando cada vez mais ácidos, anulando cada vez mais buffers, que pagam cada vez mais contas (soltam um hidrogênio), fazendo um ciclo infinito de regeneração cada vez maior. É como carros entrando sem parar numa rotatória sem nunca sair dela, logo, o raciocínio está incompleto. Algo mais precisa acontecer, a saída da rotatória.
Agora vem o grande pulo do gato. Nem todas as moléculas de H2CO3 aceitam pagar a conta e preferem se desfazer em CO2 e H2O (o caminho inverso da primeira reação) num ciclo não infinito, uma vez que o CO2 pode abandonar a água por volatilização.
Figura 2 – Os ciclos do CO32- dissolvido em água volatilizando em CO2 para atm ou formando buffer como HCO3–.
Agora veja bem, não é todo CO2 que reage com a água. Apenas uma fração de 1/400 do CO2 reage formando H2CO3, ou seja, 399/400 do CO2 permanece livre e é esse CO2 livre que abastece a fotossíntese das plantas. Algumas pessoas acham que é o ácido carbônico resultante da reação que as plantas usam como fonte de carbono, mas está errado, é o CO2. De todo o H2CO3 reagido, uma fração menor ainda paga a conta se firmando como HCO3– (e construindo reserva alcalina, subindo o KH), ou seja, grande parte do ácido carbônico acaba se desmanchando em CO2 mais H2O logo após a reação porque o H2CO3 é muito instável no pH praticamente neutro do aquário (o ácido carbônico só permaneceria mais estável em pH abaixo de 4, com a pressão de muitos hidrogênios livres forçando os dois hidrogênios nos bolsos do CO32-). Grande parte desse CO2 livre na água, por sua vez, não se acumula na água infinitamente, pois a água tem um determinado limite para a sua solubilidade, de forma que o excedente volatiliza da água para atmosfera. Essa é a saída da rotatória. Injetar CO2 no aquário, portanto é como soprar um balão furado; é preciso soprar continuamente para manter a pressão e fazer sua concentração subir (balão expandir) apesar da sua saída do outro lado. Assim que se deixa de soprar, o CO2 decai rapidamente aos níveis normais e o que acontece em seguida? Correto, o pH sobe porque não há mais entrada de ácido carbônico liberando hidrogênios. E o que acontece agora? Correto, o buffer não vai mais achar hidrogênios para enfiar nos seus bolsos e o KH também sobe. Essa é a lógica da aeração noturna na regeneração do KH; criar buffer por meio da rápida conversão do ácido carbônico (H2CO3) em bicarbonato (HCO3–) subindo o pH com oxigênio. Quanto mais rápida a subida do pH com a aeração, mais o ácido carbônico aceita doar um hidrogênio se convertendo a bicarbonato ao invés de se dissociar em CO2 e água. Capiche? Pode parecer confuso lendo apenas 10 vezes, então leia de novo, escreva e desenhe.
Algumas pessoas levam a dúvida (ou a curiosidade) mais a fundo: o que o oxigênio faz na água que faz subir o pH? Essa dúvida eu só tinha respondido em aula, nunca nos livros, porque pode realmente confundir um pouco as coisas, mas vamos lá… uma parte do O2 reage com a água num processo de redução (aceitando elétrons da água), tendo dois resultados possíveis: água (em pH mais ácido) ou OH– (em pH neutro). Portanto, ao injetar ar no aquário, o oxigênio literalmente vai criar hidroxilas OH– loucas para encontrar seu par perfeito H+ e formar água, subindo o pH.
Agora vamos finalmente falar da tabela de CO2 e como usá-la como uma ferramenta de manobra com várias finalidades.
Figura 3 – Tabela de CO2 pelo cruzamento do pH com KH.
Essa é a tabela de CO2 do Livro 1. Primeira coisa a se notar: supondo uma água de torneira praticamente sem CO2, como sempre vem, com um pH em torno de 7, temos um KH abaixo de 1. Essa é a água que a maioria de nós recebe em nossa casa. Agora suponha essa água num aquário e o aquarista queira injetar CO2 em 30 ppm, para quanto iria seu pH, uma vez que o KH está abaixo de 1? Correto, em torno de 6. Nesse pH, mesmo com um CO2 nem tão alto assim, os peixes morreriam de asfixia. A culpa não é do CO2 exatamente, mas do pH baixo demais. Esse é outro grande erro dos aquaristas, de achar que o CO2 em si é perigoso para os peixes. Na verdade, o CO2 só é perigoso em pH baixo, quando o O2 é reduzido e convertido a H2O, baixando sua concentração perigosamente (veja a reação do oxigênio com a água nas equações acima). Aqui vale um pouco mais de informação: o oxigênio dissolvido em água numa temperatura de 25oC na pressão atm nos dá 8 ppm de solubilidade. Em pH mais abaixo de 6,6 com constante injeção de ácido (vindo do ácido carbônico), o sistema pode chegar facilmente a 2 ppm, que já é admitido como anóxia. É por isso que precisamos aerar também o aquário tanto quanto precisamos injetar o CO2, mas tanto quanto aerar, precisamos prevenir a queda do pH e, para isso, precisamos de buffer. Se você está acompanhando até aqui, muito bem, continue!
No caso seguinte, o aquarista sobe seu KH para 8. Para quanto vai seu pH sem CO2? Para encontrar esse pH, precisamos encontrar qual coluna na linha do KH 8 tem 2 ppm de CO2… isso passa de 7,5. E aí aparecem muitas pessoas perguntando como subir o KH sem subir demais o pH e a resposta em 10.000% das vezes é USANDO O CO2. Não há outra maneira. Esqueça troncos, turfa, xaxim, folhas de castanheira, mantras, cristais na janela ou “buffer ácido”, com um KH poderoso desse somente uma poderosa injeção constante e sistemática de ácido pode fazer uma queda de braço e trazer o pH para baixo. Vamos supor, então, que o aquarista suba o CO2 para 40 ppm e… bingo! O pH cai para 6,8. Nesse pH o oxigênio não é convertido a água e o CO2, mesmo bem mais alto que 30 ppm, não incomoda os peixes e não há risco de anóxia. Acredite, já vi aquários muito saudáveis com peixes tranquilos com CO2 em quase 120 ppm! Como isso pode ser possível? Devemos olhar para seus KH e vamos encontrar algo em torno de 10. Isso é necessário? Claro que não, alguns aquaristas de concurso são malucos e tocam seus aquários assim no bico da bota mesmo com a única finalidade de fazer as plantas crescerem e criar layout para a fotografia. Não há a menor necessidade de um aquarista comum torcer tanto assim o botão de seus aquários, principalmente quando se pretende mantê-los para o longo prazo. Um KH de 6 com um pH 6,6 está perfeito, fornecendo quase 50 ppm de CO2 para as plantas. Alguns agora podem perguntar “mas 50 ppm não é excesso?”. Quem disse? Sua tabelinha da Tropica de 20 anos atrás? O print do fórum de 2007 que você guardou como referência? Esqueça esses critérios, é preciso se atualizar. Hoje sabemos, inclusive pela própria literatura científica, que as plantas imersas precisam de vinte vezes mais CO2 que as terrestres, com algumas espécies C3 conseguindo saturar a fotossíntese somente em 70 ppm (Wetzel, 2010)!
Agora dá para entender o quanto é difícil ajudar as pessoas com suas dúvidas em apenas uma linha de resposta como elas gostariam. Elas chegam com problemas de algas e plantas fracas e dizendo que o CO2 está em 25 ppm. Não é tão simples pedir para que subam o CO2 para 50 ppm; e se eles estão com o KH em 3? O pH cairia perigosamente para 6,4 e então o aquário chegaria na anóxia. É difícil dar respostas, precisamos que as pessoas entendam as respostas, é preciso que todos estudem essa tríade KH, pH e CO2 minimamente para saber como manobrar seus aquários.
Vamos para o próximo caso. Supondo um aquário com CO2 alto, 65 ppm, com pH/KH de 6,4/5, e o aquarista deseje baixar o CO2 para 50 ppm, para quanto iria seu pH? Exato, ele não conseguiria nenhuma mudança nas medições. Se ele baixar o CO2 até o pH subir para 6,6, ele chegaria com o CO2 e 40 ppm. Para manobrar o CO2 em 50 ppm, ele precisa baixar o CO2 um pouco E subir um pouco o KH para 6 conseguindo, dessa forma, uma leitura melhor do aquário com pH em 6,6. Show de bola! E para onde iria seu pH a noite com o CO2 caindo a cerca de 10 ppm? Isso mesmo, em 7,2 ou 7,4, porque o KH praticamente não muda. Isso é um problema? De forma nenhuma, os peixes e plantas admitem essas oscilações cíclicas entre dia e noite, exatamente como acontece na natureza também. O problema são coices de pH, picos, de forma que os peixes não tem tempo de adaptarem suas mucosas e equalizar os gases em sua corrente sanguínea, ocasionando até embolias fatais. É como um mergulhador que emerge de profundezas oceânicas; ele precisa subir devagar, caso contrário, os gases no seu sangue, antes pressurizados pela coluna d’água, despressurizem e façam bolhas que são fatais quando chegam no coração. Com os peixes é a mesma coisa e aqui vale mais uma recomendação: desligue o CO2 em dia que o aquário recebe novos peixes. Se eles receberem um choque de concentração gasosa (uma diferença importante de concentração de gases entre a água e seu sangue), eles podem morrer de embolia que pode ser percebido com a formação de bolhas presas em suas guelras. Não há o que fazer quando isso acontece e os peixes agonizam lentamente. Não permita que isso aconteça.
Agora vamos supor uma partida no escuro, um dark start, com KH 8. Como não tem plantas, não é preciso CO2, certo? Talvez esteja errado. Olhe a tabela e veja quanto estaria o pH assumindo uma concentração de CO2 em torno de 5… 7,6! Sabemos pelo Livro 1 que a nitrificação gosta de pH mais alcalino e mais oxidante para operar, mas não tão alcalino assim. Podemos ver no gráfico abaixo que as Nitrosomona até não se incomodariam, mas as Nitrobacter sim, fazendo, por conseguinte, sobrar nitrito no sistema e causando surtos de algas marrons quando as lâmpadas acenderem. Logo, para manter um pH mais favorável ao desenvolvimento do biofiltro, digamos em 7,2, mesmo no dark start, precisamos sim, em alguns casos, da injeção de CO2. Em quais casos não precisamos do CO2? Ora, basta não ter um KH tão alto no início, bastando 5 ou 6, e podemos ter um pH de 7,2 sem CO2. Vejam como as condições do dark start sem CO2 andam no limite do pH favorável ao biofiltro.
Figura 4 – Gráfico de desempenho das colônias nitrificantes em função do pH.
O mesmo é verdade para muitos aquários sem plantas que precisam de KH mais alto, tais como os aquários de discos selvagens que não toleram água alcalina. É preciso injetar CO2 para puxar o pH para baixo enquanto se dá um pouco mais de KH. O CO2, nesses casos, não tem nada a ver com fotossíntese, mas funciona como mediador químico entre o KH e o pH. Essa é a segunda função do CO2 no aquário plantado, nem tudo se trata somente de fotossíntese.
Agora mais um caso, quando o aquarista já está com um bom KH, digamos em 5, e com uma boa concentração de CO2 para um aquário forte densamente plantado ou em tratamento contra algas peteca, digamos em 65 ppm; seu pH está baixo demais, em 6,4. Nesses casos pode acontecer de aparecerem algas decorrentes do baixo rendimento do biofiltro, pois sabemos que as colônias não funcionam muito bem em pH tão baixo. Então o aquarista quer manter a concentração do CO2, mas numa faixa de pH mais confortável. O que ele deveria fazer? Ele precisa subir o KH um pouco para a mesma concentração de CO2 bater numa faixa de pH mais alta. Se subir o KH para 6, o pH vai ficar no meio do caminho entre 6,6 e 6,4, difícil de ler. Então é melhor subir pra 7, conseguindo o pH 6,6.
Em seguida vamos ver um descuido relativamente comum, quando o aquarista faz a troca parcial de água, mas esquece ou deixa para corrigir o KH no dia seguinte. Vamos supor que o aquário estivesse com o CO2 em 50 ppm assegurado por um KH 6. Logo depois da TPA, o CO2 volta com força e, supondo que o KH tenha caído para 2, olha só para onde vai o pH… abaixo de 6,2. Em questão de uma ou duas horas, quando o aquarista perceber, já vai ter um pirão de peixe no caldo de ervas com sabor de tristeza. Jamais deixe para depois a correção do KH após uma TPA com o CO2 ligado!
Como vimos, o trio pH x KH x CO2 é um conjunto de causas e efeitos em loop intimamente relacionados entre si, ou melhor, no fundo são a mesma coisa. Com um pouco de raciocínio podemos perceber que o pH e o KH são apenas aspectos diferentes do CO2 dissolvido em água. Manobrar o aquário e usar a tabela de CO2, portanto, não são coisas tão simples e números mágicos não podem existir; não existe um pH alvo, nem um KH alvo, pois tudo depende da concentração de CO2. Muitas pessoas não pensam sobre isso, algumas por desconhecimento e outras porque desprezam mesmo o conhecimento, julgando-o dispensável. “É só um aquário plantado o que quero” eles dizem, mas o preço é esse. É como musculação; você pode estudar fisiologia do exercício, nutrição e biomecânica por conta própria para alcançar o desempenho desejado, isso é possível, mas a grande maioria das pessoas prefere pagar um profissional, que é mais fácil e mais inteligente. Com o aquário plantado, por outro lado, não existem “personais aquascapers”. Existem algumas pessoas dispostas a ajudar, mas nunca serão os donos do seu aquário ou do seu desempenho. Esse é um caminho que devemos trilhar sozinhos.
Se tratando de fundamentos teóricos e práticos do aquário plantado, esse conteúdo é o mais básico e urgente. Ele se mantém constantemente presente na realidade do aquário até o fim da sua vida. Outras questões, como precipitação de nutrientes e razões de elementos, são assuntos também muito importantes, mas não mais que esse. Vemos muita gente dispersa com medição de TDS, nitratos, fosfatos e amônia, mas ninguém muito ciente desses fundamentos, preferindo simplificar as coisas lendo drop-checker, canetinhas de pH, automatizações de sistemas de pH, cálculos estequiométricos de nutrientes ou se deve apagar ou acender os LEDs verdes da luminária. O tripé pH x KH x CO2 é uma lei no aquário plantado e são eles que preparam todo o terreno para tornar possível o seu desempenho.